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Ainda não estou 100% recuperado de uma gripe chata. Lá em casa, a essa altura, ninguém escapou incólume dessa onda. A última a sentir os seus efeitos foi a minha filha, que começou a se sentir mal na noite de ontem (domingo). Felizmente, lá em casa estamos todos vacinados. Agora é ter paciência, nos hidratarmos bem, dormir o máximo possível e esperar essa gripe passar completamente. Na semana passada, no auge do meu mal-estar, tomei coragem para assistir à série “Trickster, o agente do Caos” (que está disponível na Globoplay). Eu disse que “tomei coragem” porque, apesar de a temática ter tudo a ver comigo, o primeiro episódio demorou um pouco para me convencer (eu já havia tentado assistir à série em outra ocasião e na época acabei desistindo). Mas, dessa vez fui até o final e estou feliz com isso, porque a série é boa, é baseada em folclore indígena (no caso, de uma tribo originária da América do Norte, onde hoje fica o Canadá), e tem um quê de terror e mistério sobrenatural.
Bom, quero falar um pouco sobre a série e sua temática e, embora eu não queira entregar muito do enredo e desfecho da história, ainda assim terei de dar alguns spoilers.
“Trickster - O Agente do Caos” apresenta uma família disfuncional, com pais divorciados e cheios de problemas, como o abuso de álcool, drogas e dificuldades financeiras. O protagonista, Jared, é um adolescente que acha que está ficando maluco devido ao uso de drogas, mas que também suspeita que na verdade está seguindo o mesmo caminho da loucura que acomete sua mãe; que escuta vozes. Apesar de tudo, a série deixa claro que o rapaz é em essência uma boa pessoa e na medida do possível ele é bastante esforçado; frequenta a escola, trabalha meio período e recorre ao tráfico de drogas para poder ajudar seus pais financeiramente (não que seja certo recorrer a isso para ajudar em casa, mas no caso a série constrói o contexto para entendermos por que o rapaz acaba recorrendo a isso).
Além das drogas (e outros abusos como o álcool), a série faz várias críticas à sociedade moderna. Apesar de pertencerem aos remanescentes de uma tribo originária da região, Jared e sua mãe estão integrados a uma sociedade moderna e capitalista, tendo de lidar com preconceito devido à sua origem indígena e com todos os traumas que a colonização brutal deixou sobre sua terra e seu povo.Mas é claro que os problemas não poderiam parar por aí. Jared descobre que suas visões não são maluquices e que sua família não é o que parece ser de verdade… Tudo começa a sair dos eixos quando ele conhece o misterioso Wade; um antigo amigo do seu pai, que alega ser o seu verdadeiro pai. Até aí, pode parecer um drama familiar típico de novela mexicana, mas a questão é que Wade não é um ser humano, ele é um Trickster (um Trapaceiro), uma entidade mitológica com poder metamórfico muito longeva e que só pode ser morta por outro Trapaceiro, entre outras coisas.
A série também apresenta outras figuras mitológicas do folclore local, como os “Anciãos” e as “Bruxas”.
Bom, eu realmente recomendo a série. Não digo que ela é fantástica e economiza muito com efeitos especiais (na verdade, isso provavelmente é devido a limitações de orçamento e sabiamente a produção da série evitou ao máximo o uso de efeitos especiais elaborados). Mas a série é muito competente e entrega o que se propôs a entregar com os poucos recursos de que aparenta dispor. Me lembrou muito o estilo das séries dos anos 90 com temática de terror, em especial me lembrei muito de Arquivo X.Mas, o que me levou a assistir essa série, de fato, foi o seu título: Trickster. Acontece que já fazem alguns meses que eu estou estudando esse arquétipo. Comecei meus estudos ao descobrir que muitas personagens importantes nas minhas histórias; entre antagonistas e protagonistas, possuem características típicas de trickster. E quando, em meio aos meus estudos, descobri que havia uma série com esse título, fiquei logo interessado em assistir para saber mais do que se tratava.
Acontece que o Trapaceiro (em inglês Trickster) citado na mitologia aborígene dessa série é um dos mitos que ajudou a cunhar o termo que serve para designar um “arquétipo” mais amplo e que está presente em muitas culturas e histórias, encarnado nos mais diversos personagens.
O Trickster é chamado de “o deus das encruzilhadas e fronteiras”, muito embora esta entidade nem sempre seja retratada como um deus. Para os nativos norte-americanos o Trickster podia ser o Corvo, o Coelho e o Coiote. Na cultura grega quem faz as vezes de Trickster é Hermes; o deus que transitava livremente entre o mundo dos vivos e dos mortos, pregava peças em outros deuses e protegia os viajantes (entre muitas outras coisas). Na mitologia nórdica temos Loki como um Trickster e na cultura pop mais recente temos vários protagonistas que possuem os atributos de um Trickster. Dois exemplos que gosto de citar são Pernalonga e Patrick Jane (de O Mentalista).
Agora eu preciso ficar por aqui. Mas, em outro momento voltarei falando mais sobre Tricksters.